chegamos!
edição 07, mês 07, sabe o que isso significa? nada, senão que o número me agrada. então bora lá com notícias, pitacos e provocações
a longuinha da semana
o caso Klara Castanho sob a perspectiva da proteção de dados pessoais
se você esteve em terra brasilis no último mês, deve ter ficado estarrecido com dois casos de enorme repercussão: o primeiro, o da garota de 11 anos, estuprada aos 10, a quem negado o direito ao aborto, após ser ouvida como se adulta (e culpada) fosse, e o da atriz Klara Castanho, que deu à luz após engravidar, igualmente vítima de estupro, tendo entregue a criança à adoção, hipótese expressamente prevista em lei.
para além da gritaria de uma parcela (irracional) da população, a ideia aqui é analisar o caso da jovem atriz não sob a perspectiva do estupro e/ou da adoção, mas sim sob a perspectiva da privacidade e proteção de dados pessoais.
segundo relatou, a atriz teria sido vítima de inúmeras violências, além da carnal, tendo uma delas se caracterizado pelo vazamento à imprensa da gravidez e entrega à adoção da criança. tal vazamento, segundo relato da atriz, teria sido ameaçado logo após ao parto, por uma enfermeira. a despeito de toda a situação relacionada, como dito, o vazamento ocorreu.
Klara Castanho foi, mais uma vez, violentada, mas agora em seus direitos constitucionais à privacidade e proteção de dados. são sinônimos? não! Klara Castanho foi, portanto, vítima de violação de dois direitos fundamentais, distintos, mas muitas vezes complementares. um de índole subjetiva, a privacidade. outro, de índole objetiva, a proteção de dados.
nenhum dos dois foi respeitado.
chama ainda mais atenção o fato de o vazamento ter se originado em um estabelecimento hospitalar, ao que parece, por uma profissional de saúde (que não tem nem dignidade para carregar tal alcunha). dados de saúde são dados sensíveis, assim especificados em lei. teoricamente, deveriam ter elevado nível de proteção.
violações de dados e privacidade ocorridas em hospitais não são inéditas.
antes da lgpd, a ex-primeira dama Marisa Letícia, já falecida, teve vazados prontuários médicos em mais de uma oportunidade.
em portugal, centro hospitalar barreiro montijo foi multado em 400 mil euros por violação ao gdpr, isso porque dava acesso à prontuários de pacientes a pessoas que não deveriam ter esse privilégio, por ausência de necessidade (princípio).
encorajada pelo relato de Klara, a influencer Gabi Brandt revelou que já teve dados vazados em duas oportunidades, em um mesmo hospital.
deixada de lado a atitude, típica de uma sociedade doente, praticada por pessoas ainda mais doentes, a questão que surge é: quem responde pelo vazamento ocorrido?
nos termos da lgpd, o hospital, enquanto controlador dos dados, é responsável pela violação, ainda mais porque praticado, ao que parece, por enfermeira que era sua funcionária (não operadora). ainda que o vazamento tivesse ocorrido por fato imputável a algum operador de dados, o hospital, enquanto controlador, seria responsável, cabendo então regresso.
vejam o quanto é fundamental um contrato de trabalho adaptado às normas de proteção de dados, estabelecendo direitos e deveres de todo trabalhador. com a previsão, e sem sombra de dúvidas ou interpretações, a enfermeira poderia (deveria) ser demitida por justa causa.
a enfermeira, pode ser pessoalmente responsabilizada pela atriz?
sob as premissas da lgpd, discutível. entretanto, indiscutível que pode ser responsabilizada pelas regras de responsabilidade civil previstas no código civil, por violação à sua privacidade.
como referência, no caso citado do vazamento dos prontuários da ex-primeira dama, a princípio o hospital apontou responsabilidade de uma médica, demitindo-a por justa causa. a médica comprovou não ter vazado os prontuários, que já circulavam na internet antes mesmo do horário em que entrou no plantão na data do evento, revertendo a decisão, sendo o hospital condenado a pagar indenização de 577 mil reais à profissional.
a título conclusivo, de nada adianta prever dados de saúde como dados sensíveis. é fundamental se educar para a proteção de dados. que os responsáveis sejam apurados e severamente punidos.
as curtinhas
tem culpa eu tem culpa cátia
um homem, responsável de uma empresa encarregada de fornecer benefícios a famílias isentas de impostos na cidade de Amagasaki, acabou passando um pouquinho do “bebo socialmente”, meteu o pé na jaca em um jantar, ficou doidão, dormiu na rua e, quando acordou, percebeu que havia perdido um hd com dados de mais de 465 mil habitantes da cidade.
segundo a autoridade municipal, o hd continha informações confidenciais, incluindo detalhes fiscais, nomes e números de contas bancárias, além de informações sobre famílias que recebiam auxílios estatais, como pagamentos de creches, e o funcionário não tinha autorização para transferi-los para dispositivo externo.
que baita incidente de dados.
como já dizia o poeta, tem culpa eu tem culpa cátia, a desgramada da catchaça
tá de sacanagem, procon-sp?
apesar de toda jovialidade desta newsletter, não é a primeira vez que o órgão de defesa teórica dos consumidores de sp aparece por aqui.
a primeira, quando mandou a organizadores de um show que explicassem a razão de ingressos terem se esgotado tão rapidamente (pai amado…).
mas agora, os paladinos da vulnerabilidade divulgaram orientação que é de cair o queixo (para não usar outra expressão mais recente).
questionados se a compra de um nft estaria sujeita às regras do direito ao arrependimento, o órgão de defesa afirmou que sim, desde que a compra tenha sido realizada em site com representação nacional.
aparentemente, a pessoa que respondeu ao questionamento não tem a menor ideia do que seja um nft, do que seja blockchain, do que seja um mercado secundário, opensea, mintar, e por aí vai.
apenas para se ficar em um exemplo bem basicão, imagine que alguém adquira um nft em exchange nacional, ou com representação nacional. como quaisquer outros ativos de alta volatilidade, imagine que o token sofra forte desvalorização no dia seguinte. ok, segundo a orientação do procon, basta se arrepender. mas, e se a compra tiver sido feita apenas realizada na plataforma, mas de outro particular? e se, apesar de mintado por uma empresa, o nft tiver sido adquirido já no mercado secundário?
o simplismo mata ou, quando menos, envergonha.
pode apostar, quando a bochecha corar, vão culpar o estagiário.
momento black mirror - a volta dos que já foram
rapaz, a amazon está testando um novo recurso para sua assistente de tudo, a famosa alexa, que permitiria a simulação de conversas com pessoas já falecidas, a princípio parentes.
a empresa explicou que a voz seria reproduzida a partir da utilização de inteligência artificial, que aprenderia com áudios deixados pela pessoa já falecida. mas, e onde estão esses áudios? tem de monte solto por aí, basta pensar no tanto de áudio que você recebe e envia pelo zap, todo santo dia (não entraremos, ao menos nesta edição, na questão da legalidade do processo de obtenção).
a amazon defende o recurso com o argumento da necessidade de humanização dos assistentes de voz. nas redes, povo ficou dividido.
verdade é que os deep fakes já são uma realidade. dúvida? tem até perfil deep fake da atriz margot robbie fazendo sucesso no tico-teco. veja aqui, é absurdo!
sei lá, eu acho tudo isso meio creepy, mas tem gosto pra tudo, que o diga a uva passa no arroz.
quer ver o vídeo da demonstração (da conferência toda)? clique aqui
stj x stf e o direito ao esquecimento. ou não?
para quem não sabe, a luta livre já foi estrela da tv brasileira, em especial nos anos 80, quando transmitida aos finais de semana, em horário nobre.
em vários países, segue sendo mainstream, que o diga o wwe - wrestlemania, febre nos estados unidos.
a pancadaria rola solta, mortais, pessoas sendo jogadas para fora do ringue, e por aí vai. tudo real, assim como é verdade esse bilhete.
recente decisão do stj, ao que parece, desafia a posição do stf segundo a qual o direito ao esquecimento seria incompatível com as normas constitucionais (sempre me dá gastura ter de escrever isso).
em linhas gerais, os ministros do stj determinaram a desindexação de termos específicos em mecanismos de busca, fazendo com que os resultados “desaparecessem” da rede, ao menos a quem estiver realizando pesquisa.
questionados se a decisão não violaria o quanto decidido pelo órgão máximo da magistratura nacional, os ministros disseram que não, que apenas mandaram desindexar, não esquecer…
ah, tá.
é verdade esse bilhete (e viva o STJ).
Aqui em terras "pessoenses" tivemos um prontuário médico "vazado" para demonstrar que pessoa influente envolvida em acidente estava embriagada. Só esqueceram que as consultas deixam rastros no sistema... Ingenuidade ou certeza de impunidade.